Sonhar Com Leões

9/12/2025 01:54:00 AM |

Se tem algo que gosto quando vou ao cinema é entrar numa sala para conferir algo bom e sair da sessão com o sorriso estampado no rosto de terem me satisfeito com a entrega completa, pois muitas vezes uma trama é boa, mas não satisfaz, deixando pontos em aberto para continuações, ou então não empolgando o suficiente, entre muitas outras situações, e algo que anda fazendo com que isso ocorra demais são as longuíssimas durações dos filmes atuais, pois acabam enrolando e por vezes entregando um clímax que apenas falamos ok. E hoje foi um dia desses, pois com apenas 88 minutos deliciosos, Denise Fraga incorpora os grandes mestres da atuação de quebra da quarta parede, e ao mesmo tempo que sofre com as dores do câncer de sua personagem, as atrofiações motoras que sofreu nas outras tentativas de se matar, ainda sobra tempo para conversar conosco durante a exibição do longa luso-hispano-brasileiro, "Sonhar Com Leões", que mesmo trabalhando um tema duro, mórbido e até denso que é o suicídio e/ou a morte assistida para acabar com o sofrimento de dores, acaba sendo leve, gostoso e divertido pela proposta, sendo daqueles filmes que você quer mais, que entra no clima e sai alegre e satisfeito com tudo o que viu, e isso é lindo e delicioso demais. Ou seja, a formatação até irá virar uma série de vários pequenos capítulos, mas foi feito como cinema mesmo, e a entrega da personagem com um texto bem pautado e uma direção precisa agrada e funciona demais na tela, e assim sendo será muito lembrado.

No longa uma imigrante brasileira chamada Gilda enxerga o fim da linha graças a um diagnóstico de câncer que lhe dá apenas mais um ano de vida. Conformada com a doença, Gilda sonha agora em morrer com dignidade e sem dor, enquanto ainda é si mesma. Após quatro tentativas de suicídio fracassadas, porém, a mulher vai em busca de uma organização clandestina chamada Joy Transition International que diz ensinar aos seus clientes terminais a se suicidarem sem dor ou problemas em países onde a eutanásia é ilegal. Glória embarca nessa jornada de palestras, workshops e aulas ao lado do tímido jovem Amadeu, outro paciente sem perspectiva que ela conhece na corporação e que antes foi funcionário de uma agência funerária. Juntos, os dois acabam tentando desmascarar o esquema caro e absurdo da empresa enquanto tentam tomar o controle de sua própria situação.

Não conhecia o trabalho do diretor e roteirista Paolo Marinou-Blanco, mas posso dizer sem dúvida alguma que ele tem uma pegada técnica tão bem elaborada, tendo um vasto conhecimento de outros diretores e roteiristas, que acabou conseguindo deixar sua trama solta, porém sem ficar vaga, o que acaba sendo lindo de ver na tela, pois em determinados momentos você fica pensando para que uma bobeira dessa, mas logo pensa que pode ser verdade, afinal tem trouxa para tudo, e a dinâmica escolhida para os protagonistas (ela de falar com o público que está vendo o filme, e ele com os mortos) foi tão bem sacada que além de dar um bom ritmo para que o filme ficasse no tamanho exato, e principalmente não ficasse pesado com o tema, afinal sabemos que é um grande tabu falar sobre suicídios, eutanásia, e claro doenças em si. Ou seja, ele trabalhou a base sem precisar apelar, e o resultado falou sozinho de uma maneira muito gostosa de ver.

Quanto das atuações não tem como não aplaudir o trabalho de Denise Fraga, que já há muitos anos segura personagens com tanta desenvoltura, quase sempre que pode quebrando a quarta parede conversando com o público, e aqui sua Gilda usou desse artifício para brincar e contar sua história sem precisar ficar traçando longos caminhos, fora que se permitiu jogar de atacante e defensora, com um texto ácido, porém sutil, e que funciona como uma luva em suas mãos, aonde não deixa que ninguém lhe supere, mas também sem atrapalhar os que precisavam ter seus devidos momentos. E falando em momentos icônicos, num primeiro momento você fica intrigado com o "dom" de Amadeu que João Nunes Monteiro entrega com perfeição, conversando com os mortos, fazendo perguntas enquanto os maquia, e seus trejeitos de cachorro que caiu da mudança são perfeitos para a conexão explosiva com sua parceira cênica, de modo que toda a entrega funciona, e o ator mostrou muita segurança nos seus atos, ou seja, acertou demais. Quanto aos demais, cada um teve sua devida participação, desde Roberto Bomtempo com seu Lúcio desesperado com as loucuras da esposa em tentar se matar, passando por uma Victoria Guerra colocando suas loucuras como a dona da funerária, e Sandra Faleiro com sua coach de mortes, mas sem dúvida a entrega expressiva de Joana Ribeiro com sua Isa cheia de traquejos e desenvolturas acaba chamando demais os olhares para si, e podemos dizer que mesmo forçando a barra agrada demais.

Visualmente o longa é bem cheio de situações diferentes, desde um apartamento bagunçadíssimo, passando por um galpão completamente vazio, até chegarmos em praias belíssimas e um apartamento para a eutanásia em uma paisagem magnífica, tendo ainda muitos detalhes nos elementos cênicos que os coaches usam para demonstrar as formas de suicídio, e até mesmo um abrigo de animais entrou no rumo da equipe de arte, ou seja, um trabalho sutil, porém muito bem feito e ousado.

Enfim, é um longa simples, direto e muito gostoso de conferir, que chama a atenção pela essência, pelo texto e pela desenvoltura dos personagens e da direção, funcionando demais na tela e claro valendo a recomendação de conferida, tanto para rir quanto para refletir sobre como gostaríamos de passar o resto de nossas vidas, quando sabemos que ela será curta. E é isso meus amigos, fico por aqui hoje, mas volto amanhã com mais dicas, então abraços e até logo mais.


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