Já disse isso muitas vezes, mas volto a falar mais uma: a França sabe como fazer o cinema de arte ser belo sem soar cansativo, e digo isso após ver uma animação abstrata aonde uma mão decepada vai atrás de seu corpo enquanto lembra tudo o que viveu até o fatídico momento em que foi separada do corpo. Ou seja, o longa "Perdi Meu Corpo" que estreou na plataforma da Netflix traz todo um conteúdo cheio de símbolos, consegue envolver com as canções de fundo, mas principalmente ao trabalhar bem a emoção de um jovem em entregar sua paixão por uma voz, que depois passa a ser uma pessoa, e reviver tudo o que fez para um dia conseguir demonstrar isso soa tão belo de ver, que acabamos fluindo com a história de uma maneira rápida, gostosa, e que até dá para refletir muito sobre diversas coisas, mas apenas acabamos curtindo o que o longa passa, sem ir muito além. E sendo assim, mesmo sendo um mote artístico, o longa entrega beleza, dinâmica e acerta em muitos pontos, tanto que já vem levando diversos prêmios e indicações, e quem conferir conseguirá enxergar todos os motivos.
O longa nos mostra que em um laboratório parisiense, uma mão decepada escapa de seu destino infeliz e parte em uma jornada para encontrar seu corpo. Em uma assustadora fuga pela cidade, ela enfrentará ratos, pombos e outros desafios para chegar até Naoufel. Suas lembranças de Naoufel e do amor do jovem entregador de pizzas pela bibliotecária Gabrielle fornecem as respostas sobre o que causou a separação da mão e se transformam em um poético cenário para o possível reencontro dos três.
Em sua estreia na direção de longas metragens, Jérémy Clapin soube trabalhar muito bem o texto de Guillaume Laurant (mais conhecido pelo clássico "O Fabuloso Destino de Amélie Poulain", e não tentando ser daquelas milagrosas animações cheias de texturas e tridimensionalidades partiu para o 2D desenhado, comum e de uma maneira bem simples usou e abusou da trilha sonora para dar a emoção junto do texto secundário na trama, pois basicamente o envolvimento das cenas sem falas da mão percorrendo caminhos dificílimos até conseguir chegar aonde se lembra de ter visto o seu corpo pela última vez, enquanto lembra de tudo o que ocorreu até chegar naquele momento, é algo maravilhoso e cheio de sintonia, de tal forma que no início até não nos conectamos tanto, acabamos achando meio esquisito, mas com o desenvolvimento da trama o resultado muda de forma, e o envolvimento vem em cheio.
Um dos pontos mais gostosos de acompanhar em animações é a personalidade dos personagens, pois quando funcionam bem acabamos entrando em seu mundo e vivenciando o que tentam nos passar, e aqui Naoufel tem seu jeitão meio duro, mas o carisma vem em muita sintonia com tudo o que o longa tenta nos passar, de seu romantismo, de suas desventuras pela garota, e até do seu jeito desengonçado para brigar com a mosca durante toda a trama, que acabamos entendendo bem no miolo sua real vertente na mente do jovem. Gabrielle também tem um estilo marcante, mas não chega a ser daqueles personagens impressionantes, de forma que a paixonite do garoto por ela é até algo compulsivo demais para acreditarmos, mas quem somos nós para falar de amor. A mãozinha é de um carisma só, de modo que torcemos em suas fugas, torcemos para ela contra os ratos, rimos igual o bebê em diversos momentos, e o acerto encontrado para toda a movimentação é algo que certamente foi muito bem pensado, de forma a envolvermos com tudo e o resultado fluir melhor ainda. Assisti o longa legendado, com o som original, então posso dizer que as vozes francesas foram bem agradáveis, mas quem conferir ele em português comente depois para sabermos como está tudo.
Dentro do conceito visual da trama, por ser uma animação 2D tradicional não vemos nada de texturas, nem formas muito elaboradas, mas souberam trabalhar tanto o ambiente, que acabamos enxergando detalhes em tudo, principalmente nas cenas com a mãozinha indo em direção ao seu corpo passando por tantos elementos cênicos como ratos, vidros, ruas cheias de carro voando com um guarda-chuva, passando por apartamentos, e muito mais, de modo que ficamos quase que passeando junto com ela, já com o personagem inteiro vemos muito da beleza da carpintaria, conhecemos um pouco mais do mundo dos livros e dos sonhos, e claro do almejo pela liberdade de tudo, além claro dos traumas e diversos do passado como garotinho ainda, ou seja, um filme cheio de símbolos para conferirmos e analisarmos.
A trama tem um ritmo não muito acelerado, mas também não chega a ser arrastada, de tal forma que o envolvimento das cenas é bem marcado pela trilha sonora, que ajuda o público a seguir a linha que o diretor desejou, e claro fazer com que tudo flua naturalmente, e sendo assim vale conferir ela após o filme também, então deixo aqui o link para curtirem.
Enfim, é um filme simples, porém com uma pegada bem desenvolvida que fará com que muitos se emocionem, outros reflitam muito sobre diversas coisas, mas principalmente que funciona bem mais do que parece, e sendo assim tem chamado muita atenção dos críticos, e claro das premiações que tem entrado, agora é ver como se sairá no final das contas, pois veio para mexer com a estrutura emocional das grandes empresas de animação, e isso é algo bem tenso. Bem é isso pessoal, fica minha recomendação do longa, mas principalmente para adultos, pois tem algumas cenas meio pesadas, e os menores podem se assustar, então confira sem eles. Fico por aqui hoje, mas volto em breve com mais textos.
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