Netflix - 7 Prisioneiros (7 Prisioners)

11/15/2021 05:54:00 PM |

Bem sabemos que o Brasil foi um grande país escravocrata no passado, e que atualmente ainda existem muitos lugares escondidos com funcionários vivendo em uma situação análoga à escravidão, e usando dessa base o longa da Netflix, "7 Prisioneiros", nos mostra todo esse envolvimento de pessoas que são contratadas para sair do interior e ir para a capital achando que vão ganhar rios de dinheiro para voltar depois para suas famílias, mas quando veem estão presos à dívidas que nem imaginavam de ter feito e sofrendo para sobreviver. Então entra a grande sacada do longa, e que mostra algo que muitos já ouviram falar, que no passado quem comandava, vendia e intimidava os escravos eram propriamente alguém dos seus, que quando via a chance de subir na vida, ou melhor sobreviver melhor esquecia as amizades, acordos e tudo mais, afinal nessa vida vale a lei do mais forte, e a trama aqui permeia essa mesma intensidade, chamando muita atenção para tudo, além claro de ótimas atuações. Diria que é daqueles filmes que ficamos com raiva dos personagens, da situação e até tristes por ver algumas coisas, mas é o reflexo de como chegamos até os dias de hoje, e com muita força o roteiro choca e comove em cada fala seja ela dentro do ferro-velho, na festa do deputado ou até mesmo na padaria da mãe do protagonista, pois tudo faz valer o pensamento reflexivo.

A sinopse nos conta que o jovem Mateus aceita trabalhar em um ferro-velho em São Paulo com o novo chefe Luca para ganha uma oportunidade de dar uma vida melhor à família. Porém, ele acaba entrando no perigoso mundo da escravidão contemporânea com diversos outros garotos, sendo forçado a decidir entre continuar nessa situação ou arriscar o futuro de sua família.

É bem interessante de observar a formatação da proposta do diretor Alexandre Moratto, pois embora seja um filme que se olharmos a fundo é bem simples, ele conseguiu trabalhar tão bem as dinâmicas interiores, o desenvolvimento dos dois protagonistas, e mesmo os demais atores acabam passando uma certa sinceridade nos olhares para com a mudança do estilo do amigo, que num primeiro momento nem deseja tanto aquilo para com seus pares, mas a cena anterior a final define muito bem todas as possibilidades dele e o que deve seguir, mostrando coragem e claro atitude. E isso tudo mostrou a mesma coisa para com o trabalho do diretor/roteirista, pois mesmo seu filme podendo escolher outros vértices como talvez algo até mais forte, ele teve coragem de apontar o dedo e atitude de com a simplicidade da situação forte mostrar tudo o que a situação de escravidão reflete, ao ponto que todo o sentimento flui, toda a desenvoltura vive, e no final mesmo que não tenhamos nos emocionado ou chocado com algo (o que é bem difícil vista toda a situação dos garotos), ou ficado nervoso e impactado com o "empregador", ao final paramos e pensamos é bem assim que tem de ser, e que ele seja feliz.

É até engraçado falar sobre as atuações, pois embora todos estejam representando bem, não vemos uma explosão interpretativa, não vemos um ato que você queira aplaudir a expressão deles, ao ponto que todos soaram tão leves e diretos que pareceram realmente fazer isso todos os dias, no caso os rapazes serem escravos, o patrão ser um escravizador e o jovem um aprendiz das coisas ruins, e como sabemos que nenhum deles é isso, o que posso falar é que foram perfeitos demais, acertando em cheio o tom que precisavam, fazendo o ofício de ator ir num nível incrível e marcante de expressividade. E já disse isso no parágrafo anterior, mas Rodrigo Santoro acaba sendo tão ruim, tão sacana para com os garotos, e claro com todo o processo, que seu Luca retrata em perfeição o explorador, sendo daqueles que dá corda para a pessoa se enforcar, que cria o problema, mas mais do que isso, repassa seu ensinamento para o outro, e com isso pegamos um ódio do personagem, que acaba se estendendo para o ator, sendo uma grata atuação simples, forte e muito bem feita. Christian Malheiros deu um bom desenvolvimento para seu Mateus, que mesmo mudando de lado acaba mantendo seus olhares desapontados com tudo, e entregando cada nuance sua ao mesmo tempo com dor de estar fazendo, mas sabendo que se não for ele virá outro e ele acabará do outro lado sofrendo, então o jovem manteve sempre esse ar de o que fazer da vida, e foi bem em tudo. Quanto aos demais, o destaque ficou para Bruno Rocha como o grande amigo do protagonista Samuel, que acaba mudando completamente de trejeitos quando o amigo vai para o outro lado, e Lucas Oranmian com seu Izaque já mais revoltado e disposto a lutar com as armas que tiver para tentar mudar de vida, mas como bem sabemos na escravidão a força contra os maiores voltam ainda mais fortes.

Visualmente o longa trabalha praticamente todo dentro do ferro-velho, mostrando o serviço dos jovens de separação de cobre e alumínio em peças que chegam lá, despachando na sequência, vemos o ambiente aonde eles dormem trancados como uma prisão realmente, apenas com beliches e colchões fininhos sem espuma quase nenhuma, que inicialmente é até melhor que as casas dos jovens, mas depois passa a ser algo horrível, sem banho, e sem qualidade de vida alguma, tendo o escritório também não muito luxo, mas cheio de papeis, e claro as armas dos capatazes, um sofá aonde o jovem passa a dormir depois, as vans e caminhões entrando e saindo, e saindo daquele ambiente passam por outras instalações de escravos, alguns estrangeiros, vamos para uma festa de aniversário da filha de um deputado que organiza todo o processo, mostrando que são peixes grandes que cuidam de tudo, temos ainda uma balada bem imponente para mostrar outra vida para o jovem, e além disso temos lá no começo a casa simples da família do protagonista, com toda a lida da roça, que depois ainda é feita toda a analogia com a padaria da mãe do empregador que dá a letra para o rapaz, ou seja, a equipe de arte foi bem direta em tudo e agradou bem demais.

Enfim, é daqueles filmaços que mostram que o cinema nacional está cada vez melhor, e que basta ter boas ideias funcionais para que não precise apelar para cativar o público, sendo uma grata surpresa que não é arrastado, nem acaba sendo daqueles filmes que só cabem em festivais. Ou seja, sei que a Academia Brasileira de Cinema já escolheu outro longa para nos representar no Oscar e no Globo de Ouro, mas facilmente colocaria esse tanto pelo tema ser forte, pelo filme ser imponente, e claro por ter toda a divulgação da Netflix que o outro não terá, mas nossos votantes são meio estranhos, então fica a dica apenas para o público conferir e se envolver, pois vale a pena. Bem é isso meus amigos, fico por aqui agora, mas hoje ainda vou ver mais um filminho para aproveitar o feriado, então abraços e até logo mais.


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