Netflix - A Voz Suprema Do Blues (Ma Rainey's Black Bottom)

12/19/2020 01:31:00 AM |

Sempre costumo dizer que quando uma peça teatral é adaptada para o cinema precisam abrir a ideia toda senão o filme acaba ficando amarrado demais e dependendo 100% de boas atuações, e com o lançamento da semana da Netflix, "A Voz Suprema do Blues", felizmente temos dois grandiosos atores que se entregam de corpo e alma para seus personagens e acabam fazendo um filme intenso, forte, e com diálogos incríveis que certamente lhe darão indicações para todas as premiações possíveis, porém mesmo a peça tendo sido bem premiada, o longa acabou não deslanchando tanto quanto poderia, pois temos sim um ótimo visual da Chicago dos anos 20 começando a nascer, com todo o racismo explícito e com um texto maravilhoso e emocionante, mas queríamos ver algo a mais da vida da Ma, de Levee, do ambiente que sofreram para chegar aonde chegaram, não apenas de um conflito gigantesco dentro de um estúdio, pois vemos dois grandes atores dando seus shows (e sim são ótimos shows dignos de aplausos e prêmios), mas não temos um filme propriamente dito como poderia ser. Ou seja, não digo em momento algum que seja algo ruim de conferir, pois os 94 minutos passam voando, mas certamente o longa com uma história realmente bem trabalhada seria algo lindo de ver, e funcionaria muito mais do que apenas uma peça executada no streaming.

O longa nos mostra como as tensões e as temperaturas aumentam ao longo de uma sessão de gravação vespertina na Chicago dos anos 1920, enquanto uma banda de músicos espera a artista pioneira, a lendária "Mãe do Blues", Ma Rainey. No final da sessão, a destemida e impetuosa Ma se envolve em uma batalha de vontades com seu empresário e produtor branco pelo controle de sua música. Enquanto a banda espera na claustrofóbica sala de ensaio do estúdio, o ambicioso trompetista Levee - que está de olho na namorada de Ma e está determinado a reivindicar sua própria vida na indústria musical - incita seus colegas músicos a uma erupção de histórias que revelam verdades, e isso mudará para sempre o curso de suas vidas.

Diria que o diretor George C. Wolfe foi preguiçoso, pois pegar uma adaptação de uma peça, e transformar em outra peça é algo que nem o mais cansado diretor faria, afinal é fácil entregar um bom texto para que os atores desenvolvam e se entreguem ao máximo, porém ambientar cada momento, fazer com que o realismo cênico seja passado completamente junto com boas atuações, aí já entra algo que separa os homens dos meninos. Ou seja, é claro que muitos jamais viram a peça que ganhou muitos prêmios importantes, e ela contém um tema duríssimo de segregação racial e que mesmo tendo a artista ganho títulos importantes e sua música ficar mundialmente conhecida, para os brancos ela era nada principalmente na Chicago dos anos 20, porém faltou sair do palco realmente e criar uma história maior sobre a personagem, ou até mesmo sobre o trompetista, afinal tinha espaço para isso, seria bacana ver algo mais sobre a formação da banda, sobre o crescimento do blues, e assim atingiria um ponto a mais e talvez até encantasse um público maior, sem ser os curiosos que darão play no filme pelos protagonistas, ou por ser o lançamento da semana da Netflix, mas veremos como sairá nas premiações em breve.

E já que falei dos protagonistas que certamente irão aparecer muito nas premiações, diria que Viola Davis se entregou tanto para sua Ma Rainey que nem chegamos a ver a atriz no papel, mas sim uma mulher cheia de ornamentos, bem chamativa, que com uma desenvoltura corporal acaba chamando atenção do começo ao fim nas cenas que aparece, trabalhando os diálogos num ponto tão incrível que praticamente a sentimos falando, ou seja, perfeita. Já Chadwick Boseman apresenta aqui seu último filme gravado antes de sua morte, e com grandes chances pode levar um Oscar póstumo assim como ocorreu com Heath Ledger, pois o ator está memorável no papel de Levee, tendo não uma, nem duas, mas sim três cenas brilhantes que chegamos a quase grudar na tela para presenciar o que faz (a primeira contando de sua mãe, a segunda numa discussão sobre Deus, e a terceira com o fechamento do longa), ou seja, é até difícil imaginar que ele não ganhe as premiações, afinal não tivemos um ano com grandes atuações masculinas, e com toda certeza os votantes irão juntar morte mais grande atuação e lhe dar o prêmio, e sendo assim será até difícil pensar em outro nome. Sobre os demais, tivemos bons momentos com Colman Domingo com seu Cutler, tivemos um carisma e um envolvimento monstruoso de Glynn Turman com seu Toledo, e Jeremy Shamos trouxe alguns atos marcantes para seu Irvin, mas a diversão certamente recairá quando Dusan Brown começar a falar com seu Sylvester, pois foi icônico.

Visualmente friso que não atingiram o potencial que o longa poderia, de forma temos ao fundo toda a transformação do Norte dos EUA, com as pessoas indo construir um novo futuro na Chicago dos anos 20, vemos diversas construções começando, vemos claro toda a segregação das pessoas de cor com olhares e ações (como é o caso da batida de carros, que poderia ter sido mostrada por completo com um envolvimento incrível, poderiam ter mostrado mais da cena da compra da Coca-Cola na mercearia que daria um ótimo momento), mas não, preferiram socar todos os protagonistas e coadjuvantes dentro de um estúdio com 3 salas (um camarim principal, uma sala de gravação e um porão para banda), todas bem ambientadas, com os devidos símbolos para cada cena, mas que não se impõe, e mesmo mostrando a forma legal e complexa de como era o processo de gravação de discos na época, acabaram não dando o devido valor a tudo que a equipe de arte fez.

Enfim, volto a ser incisivo, não é um filme ruim de forma alguma, sendo daqueles que vemos numa tacada só, que passa super rápido, que tem uma dinâmica incrível por parte dos artistas para que mesmo cansados conseguíssemos conferir tudo maravilhosamente, mas que peca por não acreditarem no potencial completo da história, deixando apenas a peça aparecer num formato diferente, e assim sendo não envolvendo tanto quanto poderia. Ou seja, recomendo o longa pelas ótimas atuações e pelo desenvolvimento mostrado na tela, mas quem quiser saber mais quem foi Ma Rainey, quem foi a sua banda de apoio e tudo mais da história do blues, pode procurar outro material, que aqui não será o lugar. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, mas volto em breve com mais textos, então abraços e até logo mais.


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