Maria do Caritó

11/05/2019 01:00:00 AM |

Fico triste quando vou ver uma comédia nacional e ninguém na sala ri, pois quando é apenas o Coelho posso dizer que estava num dia ruim, ou que somente eu não entendi algo que a trama propôs, mas não, a sala inteira assistiu os 94 minutos de "Maria do Caritó" sem dar uma risadinha que fosse, e isso é muito triste, pois a proposta de uma comédia é fazer com que o público ria, que saia feliz da sessão, mas não, e assim como eu, a maioria esperou um pouco os créditos para ver se aparecia ao menos algum daqueles erros de gravação para ao menos divertir durante os créditos, mas nem isso, ou seja, acredito que a peça que Lilia Cabral fez por diversos anos deva ser bem mais divertida para desejarem transformar em longa, pois é impossível que seja apenas um apanhado de bons versos rimados, algumas boas sacadas bem jogadas, e uma cenografia bem trabalhada, que o potencial da atriz é imenso para o resultado que vi na telona. Ou seja, um filme que só não é pior por ser muito bem executado tecnicamente, com um visual cheio de detalhes do sertão, do povo humilde que acredita em tudo, um figurino muito bem colocado, e claro a interpretação dialogada da melhor forma possível pela protagonista, que de resto chega a ser digno do que fiz na cena em que a protagonista canta: tampar o olho para desejar não estar vendo aquilo.

A trama nos conta que às vésperas de completar 50 anos, Maria do Caritó vive em uma pequena cidade do Nordeste em meio a simpatias para que, enfim, consiga se casar. Prometida a São Djalminha assim que nasceu, devido a um parto difícil, ela nunca encontrou um companheiro de verdade. Entretanto, suas esperanças ressurgem com a chegada de um circo, já que uma cartomante lhe disse que seu pretendente seria um homem de fora.

Meu principal medo para o filme era do diretor João Paulo Jabur em seu primeiro longa após algumas novelas de transformar a trama em uma novela corrida, mas ao menos isso ele não fez, não tendo tramas paralelas, e isso já é um tremendo ponto positivo, porém faltou para ele colocar mais dinâmica no filme que transformasse os diálogos que são engraçados por natureza em um filme engraçado por totalidade, e isso é um fato que poucos diretores/roteiristas conseguem, de modo que a proposta completa da trama é boa, mas não teve uma formatação que pegasse o público e mostrasse o quão divertida seria imaginar os atos, e talvez na peça por não ter a ambientação e focar somente na pessoa Lilia no personagem, o resultado seja bem diferente. Ou seja, já vi isso acontecer outras vezes com peças transformadas em filme, e não é só nos nacionais não, pois ao ampliar o foco, o ambiente cênico cresce e muitas vezes sobrepõe a personagem/trama que é muito boa, o que é uma pena, e aqui isso ocorreu sem dó nem piedade, transformando algo que certamente é muito divertido no teatro (quem já viu a peça pode me corrigir se quiser nos comentários!) em algo triste de ver, sem atitudes, sem força, e como já ouvimos em muitos programas culinários: "sem tempero uma comida pode ser linda, que não vai ser gostoso comer!".

Sobre as interpretações, é fato que Lilia Cabral carrega o filme como Maria do Caritó, fazendo trejeitos bem colocados, dando sua cara ao projeto, e principalmente deslizando pela tela com uma interpretação primorosa, porém não tem como algo que está moldado menor se tornar maior sem uma ampliação, e aqui volto a frisar que mesmo a artista se doando ao máximo, o filme fica frouxo por precisar de mais elos, o que não acontece. Gustavo Vaz traz um Anatoli bem moldado, mas não tem um carisma forte, nem um protótipo engraçado na sua personalidade, de modo que o personagem encaixa bem em algumas cenas, mas em outras parece um enfeite na tela. Juliana Cordeiro da Cunha trabalhou sua Teodora com muita simplicidade, em um papel que praticamente não tem importância alguma até os últimos minutos do filme, aonde tudo muda, mas isso talvez um pouco antes poderia ter sido mais trabalhado e funcionar de forma diferente para a atriz se destacar mais. Leopoldo Pacheco entrega um Coronel exagerado, cheio de trejeitos e pompa, que funciona dentro da proposta, mas ao invés de soar bobo e divertido os atos que faz, acaba quase virando um vilão, e certamente não era essa a pegada do personagem, então aí está uma das grandes falhas da trama, que acabou acontecendo a mesma coisa com Fernando Neves como Monsenhor. Kelzy Ecard foi bem graciosa como Fininha, entregando um carisma de amizade muito gostoso de ver para com a protagonista, chamando atenção sempre com olhares e trejeitos esperançosos pelo sucesso da outra em sua empreitada, de modo que poderiam ter usado até mais a atriz, ou seja, foi muito bem em cena, e certamente poderia ser o elo cômico que a trama precisava em mais cenas. Alice Assef fez uma Noiva ex-defunta meio estranha, e que até funciona para o papel, mas é usada apenas nas cenas de quebra, e com isso seu personagem fica mais como objeto do que como alguém atuando realmente. Quanto aos demais todos foram usados ao menos um pouco na trama, não tendo grandes elos participativos, de modo que vale apenas um leve destaque para o exagero de Sylvio Zilber como um pai que usa a filha para seus ganhos pessoais, sem pensar em nada mais.

Diria que um dos pontos mais bonitos do filme ficou a cargo da equipe de arte, que meio que entregou a trama quase como uma colcha de retalhos bem densa, cheia de elementos cênicos bem colocados em cada ambiente para retratar bem a cidadezinha, moldaram as locações para parecer um sertão bem jogado no meio do nada, e a cada cena víamos algo a mais para embelezar o ambiente mesmo que fosse de um modo bem simples e efetivo, ou seja, um trabalho minucioso que agrada bastante no resultado final. Um ponto que costumo abordar de erro em comédias é a fotografia querer inventar moda, e cores alegres sempre funcionam muito para que um filme dê um tom de alegria, e aqui temos muitas cenas em tons pasteis, e isso puxa o filme para um lado mais dramático, mas denso, o que faz o longa não funcionar como comédia.

Mas enfim, é um filme ruim: não! Pois poderia ter sido algo completamente pior, mas por já ser uma peça de sucesso apenas adaptada para o cinema, conseguiram fazer algo funcional ao menos, então o que posso dizer de cara é que ele é um filme que errou em tantos detalhes que saiu do eixo da comédia, beirou um lado dramático romântico, e que com a falta de decisão de que lado realmente seguir acabou desandando, e sendo assim, não consigo recomendar ele para ninguém, pois na sala que conferi não vi sequer alguém esboçar um riso, ou sair ao menos feliz da sessão, e isso é um sinal de que não pegou. Bem é isso pessoal, encerro por aqui a semana no cinema, mas volto em breve com textos do streaming, então abraços e até logo mais.

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