O Abismo Prateado

5/07/2014 11:51:00 PM |

Se existe um estilo de diretor que revolta esse Coelho que mora nos cinemas é aquele que não gosta de deixar sua opinião no seu próprio filme, largando todas as arestas possíveis abertas para que o espectador decida o que acha que ocorreu, e reflita milhares de dias depois sobre o que achou do filme. Karin Aïnouz é um exemplo claro desse estilo, e seu filme "O Abismo Prateado" que é baseado livremente na canção "Olhos nos Olhos" de Chico Buarque pode ser considerado assim como muitas outras obras de sua filmografia, um recorte do cotidiano de alguém, que em um momento específico sofre algum problema, geralmente algo bem usual, e nos mostra suas causas e efeitos do que fazer nesse momento.

O filme nos mostra que Violeta é uma dentista e tem um filho adolescente com Djalma, com quem é casada há 14 anos. Ela acaba de se mudar para um apartamento em Copacabana e, após uma pausa na sua clínica, encontra uma mensagem na caixa postal de seu celular. A mensagem foi gravada por seu marido, que avisa que estava deixando-a e partindo para Porto Alegre. Ele pede para que Violeta não o siga, mas ela não segue o conselho e passa um dia pelo bairro procurando por Djalma. Até que finalmente ela decide viajar para tentar encontrá-lo no Rio Grande do Sul.

O problema desse filme particularmente, é que o drama é algo tão comum da vida moderna que sem a impressão própria do diretor, acaba parecendo é que o filme aconteceu apenas, tendo passado tão rapidamente os 83 minutos do longa que ao acabar você olha para as pessoas ao redor apenas indagando: "Está subindo os créditos mesmo?", pois naquele momento que aparentava o longa começar a tomar um sentido com a protagonista fechando seu momento de euforia pós-caos, é encerrado o filme, ou seja, o que podemos concluir novamente sobre a ideologia do diretor é nos mostrar exatamente as reações de uma mulher, escolhida entre qualquer outra, que poderia ou não ter reações dessa forma, ao descobrir que sua base de 14 anos apenas foi embora deixando o vazio, não vai importar pra ele o que ela vai fazer agora, se vai procurar um outro alguém, se realmente vai esperar o marido voltar, se vai viajar mesmo após o período de surto, nada, o diretor não quer pensar nisso, quer deixar que você tire suas próprias conclusões do que faria nessa situação. E como já falei aqui no site diversas vezes, pra minha pessoa pessoalmente isso não se chama alegoria criativa e sim frouxidão com medo de sua ideia para um fim ser fraca e questionada depois, mas temos vários outros exemplos que preferem essa forma, então fazer o que é ver e falar ok, assisti o filme.

O melhor desse estilo de filme costuma ser ao menos de grandes atuações, e Alessandra Negrini se doa completamente ao personagem, fazendo com que em momento algum víssemos a atriz Alessandra, mas sim a mulher Alessandra agindo, pois poderia ter sido colocado no papel qualquer mulher com presença marcante que recairia sempre na visão do diretor de querer deixar que o público interprete e não a atriz ali em si, e com isso ela nos convence bem. Otto Jr. faz um papel tão aberto que em momento algum chegamos à conclusão do que poderia ter levado à sua desistência após 14 anos de casamento e com cenas desnecessárias de nudez, afinal não servem para nada no longa, acabou entrando de enfeite na história assim como o filho do casal. Agora a jovem Gabi Pereira juntamente com Thiago Martins deram um bom sentido para a trama, transmitindo boas sensações para a protagonista com trejeitos humildes e bem corretos para o momento, claro que num Rio de Janeiro atual não acredito muito em momentos assim, mas agrada bem a forma passada pelos dois.

O visual da trama nem podemos dizer que foi trabalhado em essência, pois ao montar um contexto cotidiano, a atriz vive seus atos com sua casa apenas mostrando que acabou de mudar, sem ter elementos que chamem qualquer outra atenção que não seja pra isso, uma obra sendo construída assim como o que pode acontecer com a personagem, uma praia e uma boate noturna que realçam os momentos felizes e o reencontro da personagem com seu próprio eu, e finalmente um aeroporto vazio que é algo até estranho de ser visto numa capital e assusta com a mensagem simbólica que pode representar, ou seja, embora tenhamos poucos elementos físicos, os locais assumem o trabalho de auxiliar na interpretação dos fatos. A fotografia utilizou bem pouco de elementos figurativos, optando mais pela forma tradicional de iluminação, não tendo nenhum detalhe que merecesse destaque sem ser os focos e desfoques na protagonista.

Enfim, é um longa que vale ser conferido apenas se você quiser pensar muito sobre como agiria frente a situação de abandono, pois nem a canção tradicional de Chico é bem interpretada pelos protagonistas para que saiamos felizes da sessão. Como disse no início, o longa acaba sendo vazio por faltar uma força trabalhada que nos determinasse a não ficarmos apenas no cotidiano e sim saíssemos dele para a opinião do diretor. Bem é isso pessoal, recomendo somente dessa forma o filme e fico por aqui hoje, amanhã estarei conferindo o último filme do Festival SESC Melhores Filmes aqui na cidade e já estaremos nos preparando para acompanhar os próximos que poderão surgir por aqui, então abraços e até breve pessoal.


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