Alguns filmes possuem uma essência tão fechada, com nuances densas que permeiam nossa mente de tal maneira que ficamos esperando demais por algo, e quando esse algo não acontece o resultado acaba indo pelo mesmo rumo, afundando e não chegando ao clímax que tanto poderia acontecer. Dito isso, "O Estranho Que Nós Amamos" é uma obra com muita força e consegue transmitir diversas sensações durante toda a projeção, mas demora demais para conseguir atingir um ápice e floreia demais algo que poderia ser bem mais duro, ou seja, há momentos para se explorar e dinamites para explodir do começo ao fim, mas sabe quando acendemos uma bombinha, jogamos ela no chão esperando estourar, e apenas apaga a chama sem barulho algum, é o mesmo sentimento. Ficando assim apenas um longa bonito, mas extremamente cansativo e que não consegue o objetivo principal que é fazer o público ou se chocar com toda a possibilidade, ou torcer logo para algum personagem, amornando o resultado completo. Vale mais pela ótima obra cênica de época e pela fotografia densa, mas a diretora mostrou que vai ser uma das principais diretoras mundiais em breve, com uma mão precisa, que só falta lapidar para derrubar o público de vez aos seus pés.
O longa nos situa nos Estados Unidos, no estado da Virginia, em 1864, três anos após o início da Guerra Civil. John McBurney é um cabo da União que, ferido em combate, é encontrado em um bosque pela jovem Amy. Ela o leva para a casa onde mora, um internato de mulheres gerenciado por Martha Farnsworth. Lá, elas decidem cuidá-lo para que, após se recuperar, seja entregue às autoridades. Só que, aos poucos, cada uma delas demonstra interesses e desejos pelo homem da casa, especialmente Edwina e Alicia.
Mesmo com os defeitos que apontei no começo, como a falta de algo mais evidente e a falta de esquentar mais a trama, afinal temos mulheres desesperadas por um homem, temos alguém maluco de guerra numa casa lotada de mulheres e temos uma tensão iminente ocorrendo, ou seja, pacote completo para que o filme exploda e isso acaba não ocorrendo, a diretora e roteirista dessa versão (já tivemos outro filme baseado no mesmo livro em 1971), Sofia Copolla, soube dosar cada momento e exigir de todos os protagonistas uma coerência dramática para que o filme fluísse direito e empolgasse com moderação, de modo que vemos toda a essência cênica completada em cada momento do filme, e a cada ato a percepção iminente de um grande atrito só vai num crescente, fazendo com que fiquemos esperando a ação e o momento certo para que tudo ocorra, aliás, a cena mais forte do trailer já fez com que o público esperasse algo pior, e infelizmente não ocorre como deveria, mesmo que a cena anterior do ato seja bem forte e marcante. Ou seja, Copolla é uma artista bem centrada e vai melhorando a cada novo filme seu, de modo que certamente em breve só ouviremos seu nome como a executora de filmes premiados.
Sobre as atuações, tivemos grandiosos momentos por parte de Nicole Kidman com sua Martha, trabalhando sempre de um modo sedutor e centrado na responsabilidade de seu internato, chamando a atenção precisa para cada ato sem pressionar nem correr com cada situação, mostrando que ainda tem muita bala na agulha para protagonizar personagens densos. Colin Farrel trabalhou o seu John como o nome do título original já diz: o sedutor, pois consegue com seu charme e lábia deixar todas da casa (o que é bem fácil, devido às circunstâncias) aos seus pés, mas talvez pudesse ter trabalhado mais para que isso não fosse tão rápido e jogado quase, de modo que não consegue atingir a perfeição de expressões que estamos acostumados a ver ele fazendo, e claro que seu melhor momento é o desespero que aí sim vemos ele detonando. Kirsten Dunst nos entregou uma Edwina durona demais, pois certamente ela se entregaria mais facilmente para o protagonista, e assim sendo pareceu uma falta de qualidade cênica da atriz para o papel, talvez algo mais aberto chamasse mais a atenção e criaria mais conflitos, mas suas cenas finais foram precisas e certeiras. Elle Fanning só aparece realmente no momento do caos com sua Alicia, pois nas demais cenas parece ser apenas mais uma ali no meio, embora desponte um pouco com seu humor forte, mas nada de muito aparente. Dentre as menores, claro que o destaque fica para Oona Laurence com sua Amy, pois a jovem atriz demonstrou carisma e agradou bastante com o que acabou fazendo, chamando até mesmo a responsabilidade para si em diversos atos, coisa que as mais velhas ficaram singelas apenas.
O conceito artístico foi impecável, com uma locação bem colocada no meio do conflito, aonde ouvimos ao longe os tiros da guerra, fumaça e neblina para todo lado dando contrastes precisos e incríveis para cada ato, roupas clássicas da época para moças de internato (e que vão ficando mais chiques conforme vão se apaixonando pelo estranho, usando até as de festa de gala para impressionar ele), objetos cênicos pontuais que vão trabalhando cada ato de modo sensato, ou seja, um resultado muito bom de pesquisa, que poderia ter sido incrível caso bem usado. A fotografia mostrou também um grande acerto com poucas luzes, mas precisando num visual artístico focado para chamar a atenção correta nos momentos certos, seja dando as nuances misturando fumaça com pouca luz solar dos bosques, seja as velas na casa para criar tensão, ou até mesmo nos momentos mais densos com quase nenhuma luz para contrastar e envolver, ou seja, um trabalho realmente perfeito.
Enfim, é um filme muito bonito e interessante de ver, que por bem pouco não foi perfeito, pois tinha tudo nas mãos para chamar a atenção e entregar com precisão algo que chocasse ao mesmo tempo que comovesse, mas mesmo com leves defeitos ainda é algo que vai fazer muitos gostarem do que verão. Ou seja, vale a conferida principalmente pela estética e pela boa direção, mas que vai fazer com que muitos cansem pelo ritmo alongado que foi entregue. Bem é isso pessoal, fico por aqui agora, mas volto amanhã com mais um longa que irei conferir hoje, então abraços e até logo mais.
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