A Divisão

1/26/2020 03:02:00 AM |

Já desde muito tempo o Brasil anda entregando bons filmes policiais, mas sempre pecando na mesma tecla: o excesso de personagens importantes na história, de forma a quase virar uma novela ou série, e alguém precisa dar essa chacoalhada no pessoal e mostrar longas mais diretos que tivemos como foi o caso de "Tropa de Elite" e até mesmo "Alemão", aonde temos sim vários outros personagens com dinâmicas, mas não passam a ser tão representativos ao ponto de precisarmos analisar as suas vidas e caminhos abertos na trama. Dito isso, ver o filme "A Divisão" é lembrar da onda de medo que não só aconteceu no Rio de Janeiro, mas como em todo o país nos anos 90, aonde todo dia praticamente tínhamos notícias de sequestros e chantagens mil que até viraram temas de várias novelas nos anos seguinte. E a grande sacada aqui foi mostrar bem a corrupção suja nos meios políticos e policiais, aonde como bem sabemos ainda é bem sujo nos bastidores, claro tendo sempre os bons, mas os ruins são os que mais aparecem, e com uma desenvoltura bem pegada, a trama funciona, chama atenção, e só não é melhor pelo motivo que comecei o texto, de ter tantas aberturas e personagens, que diria no começo não estava nem mais entendendo quem era bom ou não, e isso quase desgasta o filme, que ao final fica interessante e forte, funcionando bastante.

O longa nos mostra que no fim dos anos 1990 uma onda de sequestros abala o Rio de Janeiro. Um grupo de policiais assume a Divisão de Antissequestro (DAAS) e a missão de desmontar as quadrilhas que transformou o crime em indústria. Nos bastidores das investigações, a disputa de poder opõe de um lado, Mendonça - policial incorruptível, porém extremamente violento - e do outro, Santiago, Ramos e Roberta - eficientes porém corruptos. O resultado: em poucos anos, zero ocorrências.

Se tem um diretor que anda errando bem pouco no cinema nacional é Vicente Amorim, que ultimamente tem trazido para os cinemas um filme melhor que o outro, e aqui embora tenha já gravado o filme em dois formatos (um para os cinemas e um para uma série que será exibida na Multishow em 5 episódios) ele trabalhou o tema bem, criou boas cenas de ação, e fez seu filme ter um conteúdo forte funcional e direto, de modo que acabamos interessados por tudo, torcemos para os protagonistas conseguirem o desfecho da trama, e principalmente o resultado não soe absurdo demais. Claro que como disse o filme funcionará muito melhor como uma série, e já que já fizeram isso, quem conferir ela na Multishow depois diga como ficou, mas felizmente a trama no cinema também não desaponta, e o resultado embora tenha um começo rápido e jogado demais, no final já vemos bons atos e o estilo do diretor com uma câmera bem presente funcionando.

Sobre as atuações basicamente o longa recai o protagonismo em cima de Silvio Guindane com seu Mendonça direto no ato que não pensa duas vezes pra torturar e matar se for preciso, no melhor estilo Capitão Nascimento que conhecemos de outros filmes, e ele faz bem seus atos, pinga suor de tanta ação/adrenalina e atinge bons momentos, o que faz valer seus atos, mas precisava um pouco mais de envolvimento psicológico no personagem para ficar completo. Já com o outro lado do protagonismo de Erom Cordeiro, tivemos quase o oposto, com alguém metódico e em busca de aparecer ou melhor se livrar da confusão com seu Santiago, o ator acabou ficando meio que apenas de olhares e vértices pontuais, sem direcionar muito atitudes fortes nem cadenciar algo que marcasse a cena, e assim seu resultado fica frouxo em diversos momentos, de forma que poderia também ter mais ação, embora tenha sido bacana ver o personagem assim também. Marcos Palmeira nem se esforça muito para mostrar que seu Benício é daqueles diretores corruptos que fazem questão de aparecer para não levar suspeitas para casa, mas como não era para dar tanto destaque nele, seu personagem meio que fica de lado durante todo o filme, e isso não é bom de ver, então falha mais pela edição em si, do que pelo próprio ator. Natalia Lage deu um tom aberto demais para sua Roberta, de modo que parece estar de um lado, daí recai pra outro, e consegue ficar ainda pior mais para o fim, mas a uma certa lógica em suas atitudes para se livrar de acusações, e a jovem faz suas caras e bocas pensando sempre nisso, o que é bacana de ver. Thelmo Fernandes foi coeso no estilo de seu Ramos, bem técnico de atitudes e chamando pouca atenção, mas fazendo acontecer, e acaba agradando bastante nas cenas que dependeram dele. Agora quanto aos demais, tivemos praticamente todos com atitudes para chamar atenção, mas como o tempo era curto demais para desenvolver os personagens, acabaram soando insossos, e isso é sempre ruim de ver, de modo que temos os deputados corruptos desesperados para aparecer na TV, a pessoa de marketing disposta a tudo para fazer seu candidato aparecer, os ex-policiais procurando uma brecha para ganhar dinheiro na aposentadoria, e por aí vai, até termos uma sequestrada gritando com caras e bocas, mas sem nada que chamasse a atenção para ela, ou seja, não vale destacar nenhum ator tirando os principais, ao menos no longa, quem sabe na série dá para ver melhor eles e falar sobre.

No conceito cênico da trama, tivemos bons momentos nas favelas sendo invadidas com toda pompa e tiroteios comuns, conseguiram criar cativeiros bem interessantes e fortes visualmente, tivemos uma delegacia simples de ambientes, mas com locais bem sinistros de atitudes, e claro muitos elementos cênicos funcionais, como armas, equipamentos de tortura, viaturas e figurinos bem trabalhados, além de televisões e telefones da época para remeter bem o estilo que víamos das negociações de sequestro da época. A fotografia usou muitas cenas escuras por trabalhar mais com ações noturnas, e isso foi bem funcional para o ato cênico, de forma que o filme todo poderia ter falhado, mas com as luzes de contra o resultado ficou até bonito de ver.

Enfim, é um filme bem trabalhado, denso na medida, mas que falha um pouco por querer ir além no desenvolvimento de personagens e não trabalhar isso, de forma que vemos tudo acontecer bem, mas como não conhecemos quase ninguém da forma que precisa, os atos parecem corridos e não chama tanta atenção. Mesmo com esses defeitos é um longa que dá para recomendar para quem gosta de uma boa ação policial, e que lembrará bem os casos de sequestro dos anos 90, mas não vá esperando muita coisa, que aí a chance de gostar bastante é maior. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, mas volto amanhã com mais textos, então abraços e até breve.

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