Eu Sinto Muito

10/15/2019 01:20:00 AM |

Já disse isso algumas vezes, e volto a repetir sempre, pois alguns filmes costumam trabalhar temas tão impactantes que sozinhos fariam um bem danado, que se a formatação ficasse apropriada para contar encantaria tantos, mas não, vão lá e misturam gêneros, tentam florear o drama de impacto, e com isso o resultado acaba nem passando a mensagem bacana que tem dentro dele, nem funcionando como um bom filme pode fazer, e assim ficamos curtindo o longa por 94 minutos nos perguntando aonde será que o diretor deseja chegar, e quando acaba falamos: "só?". Ou seja, a ideia de "Eu Sinto Muito" é mostrar o impacto e ampliar o conceito dos relacionamentos de borderlines, que para quem não conhece o termo são pessoas que vivem no extremo, tendo um transtorno de personalidade no limite das emoções, porém o diretor quis fantasiar colocando um diretor de documentários premiado tentando conseguir depoimentos dessas pessoas mostrando um pouco mais de suas vidas, de suas famílias, dos seus sentimentos, e sem amarrar nada muito bem, jogando com uma edição bagunçada, e optando por seguir por rumos até desesperados, o resultado soou bem frouxo, mesmo tendo impacto, o que fez com que sobrasse na sala só o Coelho, enquanto algumas pessoas foram embora mesmo antes do filme voltar a seguir uma linha contínua, o que é bem triste de ver, pois a trama tinha futuro pelo tema.

O longa nos conta que Júlio está tentando rodar um documentário sobre pessoas que sofrem do transtorno de personalidade borderline, mas tem encontrado dificuldade em encontrar quem esteja disposto a falar sobre o tema, e se expôr, na telona. Um de seus alvos é Isabelle, uma jovem que adora dançar e se divertir em festas de forma a amenizar a solidão e as dificuldades sociais decorrentes do transtorno.

Talvez por ser seu primeiro trabalho de direção e roteiro de longas, Cristiano Vieira talvez tenha desejado demais ampliar seu filme, pois somente as histórias sozinhas conseguiriam se moldar e interligar, talvez por encontros psiquiátricos, ou até mesmo em interseções na vida comum, não necessitando do molde de criação de um documentário, aonde foi colocado drogas e exageros costumeiros de pessoas do mundo das artes (que até podem reclamar do excesso do diretor!), mas isso é algo que só se vê após o filme feito, pois no papel tudo é muito lindo. Ou seja, o tema do filme foi bem explorado, mostrando alguns bons vértices da doença/transtorno, o estilo do diretor funcionou pela composição cênica do roteiro, mas a montagem da ideia completa ficou confusa e bagunçada demais, e talvez poderia ter sido melhorada, e longe disso virar um problema imenso para a produção, o resultado ao passar da metade acaba sendo funcional pelo menos.

Sobre as atuações, mesmo estando na parte que mais reclamei do filme (por sair um pouco fora do eixo da doença que certamente valeria trabalhar muito mais!), Rocco Pitanga entregou um Júlio dinâmico, cheio de atitude e que com muita desenvoltura trabalhou seu papel para algo a mais, e com isso ele se fez notar trabalhando para que o seu documentário fictício dentro da trama funcionasse, e seu estilo mostrou bem o vértice que vemos em diversos diretores fazendo seus filmes e sendo cobrados por produtores, pela equipe e por tudo mais, ou seja, foi bem no que fez. Juliana Schalch se jogou completamente na personalidade de sua Isabelle, fazendo no extremo, gritando, pulando, dançando e se expressando com tanta força que ficamos até impressionados de ser a mesma pessoa que está como uma enfermeira calmíssima em outra cena, ou seja, sua pesquisa para o papel foi perfeita, e o resultado foi muito bom de ver na tela. O mesmo podemos dizer de Carolina Monte Rosa, que entregando uma policial forte e bem colocada com sua Marta, tem momentos calmos ao pintar a tela junto do marido, mas que na explosão muda tudo. Em compensação Wellington Abreu soou calmo demais para seu Cláudio, de modo que até da raiva do excesso e iria para o mesmo lado que sua esposa. Na outra ponta o casal vivido por Paula e Guilherme, no caso os atores Camila Alencar e Victor Abrão deram tons mais focados para o transtorno, mas com boas cenas e bons desdobramentos.

No conceito visual a equipe de arte foi bem ampla nas locações, transformando a cidade de Brasília em algo movimentado, entregando ares de cultura, de dor, de sentimento e diversos movimentos possíveis para ambientar que não é somente em lugares fechados que se escondem as pessoas com o transtorno, e uma pode estar ao seu lado precisando de algum tipo de carinho/ajuda, ou seja, foram simples de elementos, mas bem conectados com tudo. A fotografia brincou com muitas cores, mas sempre deixando para as cenas tensas o tom mais escuro, como se puxasse a densidade de cores para algo íntimo e próprio de cada um, ou seja, foram bem também.

Enfim, é um filme simples, que já falei tudo o que achava possível de mudar para uma melhora considerável, mas que ao menos passou bem a mensagem da doença, desenvolveu boas atuações e até consegue chamar atenção pela proposta em si, que certamente num segundo filme o diretor irá agradar mais, mas pelo que temos aqui muitos que forem assistir talvez saiam levemente desapontados, e assim não posso dizer que recomendo ele com todas as forças. Vale pelo tema em si, mas não pela construção dele. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, mas volto em breve com mais textos, então abraços e até logo mais.

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