A Vida Em Si (Life Itself)

12/03/2018 01:48:00 AM |

É interessante que ouvimos no longa "A Vida Em Si" a frase dita de maneiras diferenciadas por vários personagens que a vida em si é um narrador não-confiável por nos pregar peças ao longa de sua duração, e com essa jornada, o diretor conseguiu nos pregar diversas peças de seu longa, criando possibilidades, pontuando tragédias, e envolvendo de uma maneira diferente, pois estamos costumados com algo maior que vai se afunilando, e aqui temos uma história aparentemente pequena, que vai se abrindo, voltando às vezes um pouco no tempo para criar os rumos da família, encontrando heróis e vilões que podem se oscilar no mesmo personagem inclusive, para chegarmos ao final de uma grandiosa coincidência que parte da seguinte premissa que tanto ouvimos: "coisas que só acontecem em filmes/novelas/romances". Ou seja, podemos até encontrar muita metalinguagem e diversificação integrada no molde entregue pelo diretor para sua obra cinematográfica, após ter criado uma das séries que mais emocionou o público televisivo, mas faltou entregar mais da emoção realmente que havia no trailer para que seu longa ficasse emocionante como deveria e fizesse o público lavar a sala do cinema, mas ainda assim é um romance formatado como livro bem gostoso de acompanhar.

A sinopse é bem simples, e nos conta que a partir da história de amor de um casal, um drama multi-geracional abrange diferentes décadas e continentes, percorrendo das ruas de Nova York ao interior da Espanha.

Dan Fogelman é mais conhecido nos cinemas por ser roteirista de grandes animações, mas foi na TV que estourou realmente por criar a série que vem emocionando o mundo já tem alguns anos, "This is Us", e agora na sua tentativa de direção/roteiro de um longa mais envolvente usando as mesmas artimanhas da série, ele conseguiu entregar uma tratativa coerente, com uma pegada cheia de metalinguagens, mas que falta um pouco com a personalidade emotiva que o longa pedia, pois temos diversos atos que chocam em si, diversas referências às ideologias de heróis e vilões, muitas conexões familiares fluindo através dos personagens em diversos anos de suas vidas, mas falta aquele tiro que derrubasse os queixos, pois tirando o momento contundente que liga tudo, e é mostrado logo no começo, tudo flui de forma bem previsível, o que não é bacana de ver em um romance dramático, e assim sendo, o resultado soa bonito, até pode pegar alguns que estiverem mais emotivos no dia, mas que não mostra toda a capacidade que o diretor poderia ter alcançado caso desejasse bater mais forte, afinal o elenco era de primeira linha, e certamente conseguiria entregar muito mais na telona caso fosse trabalhado, e assim sendo, diria que Fogelman foi apenas simples e seguro demais.

Sobre as atuações, temos de falar de cara que todos foram incríveis, entregando boas personificações, e criando momentos próprios para cada época, trabalhando seus atos com bons olhares e tensões para que o filme fluísse no contexto correto que desejavam, e acertadamente, o filme vai até onde desejavam, pois os atores se enquadraram bem na moldura proposta. Chega a ser até difícil destacar cada um, mas inicialmente temos bons momentos de loucura de Oscar Isaac em seus dois bons atos de seu Will, tanto no vértice amoroso quanto na insanidade completa, mas que de maneira bem contada, ele conseguiu fantasiar e entregar tudo de uma maneira tão bacana, que chegamos a pensar em sonhos e tudo mais, mas ao menos foi coerente e surpreendente, pois acertou no que fez. Olivia Wilde também sempre entrega bons papeis, e sua Abby é simpática e simples para entregar toda sua euforia, de modo que poderia ter ido muito além de sua personificação para os demais momentos, mas optaram por não deixar que fizesse nem metade do que sua mente entregava, e isso foi ruim. Logo na sequência nos é entregue a Dylan de Olivia Cooke, que mostra um pouco mais da dinâmica dessa garota que explodiu nesse ano com "Jogador Nº 1", e que certamente vai entregar muita coisa boa, mas aqui deu seu ar de rebelde exagerada demais em alguns atos, mas foi doce para encaixar momentos sublimes junto do avô e para claro a sequência final da trama, que foi um belo encontro. Pelo lado hispânico, caímos inicialmente claro nele, Antonio Banderas com uma pegada forte, mas ao mesmo tempo aberta para bons frutos com seu Saccione, e é interessante que ele de cara já entrega sua forma de maneira adocicada, mas que o seu revés não aceita, e isso é estranho de assumir, pois mesmo sendo um feitor riquíssimo, ele não recai muito como "comprador" de uma família como é visto, e fazendo claro seu olhar de gatinho do Shrek, ele nos convence disso, e claro se sai bem. Não conhecia muito Sergio Peris-Mencheta, mas seu olhar e estilo chamam muito para personificações de vilões, e certamente veremos ele em algum filme fazendo isso, pois embora tenha sido entregue algo mais doce para ele, seu resultado parece ser algo triste demais, e faltou algo a mais para que ele fluísse sem ficar monótono demais com seu Javier, e assim sendo, foi o que menos alcançou longos voos. Pelo lado feminino espanhol, Laia Costa conseguiu entregar uma Isabel doce, sonhadora, e interessante dentro da proposta para seu filho ir além, entregando o amor e todo o trabalho que as mães tem com seus filhos, agradando demais em tudo, além claro de olhares meigos e bem colocados. E claro o grande encontro de tudo ficou a cargo de Àlex Monner como Rodrigo já adulto e Adrian Marrero como criança, para termos cenas duras, mas bem emotivas por parte dos garotos, que conseguiram ser coerentes com cada momento, trabalhando muito os olhares, e acertando em cheio. Para finalizar tivemos ainda boas participações, de Annette Bening como uma terapeuta muito bem colocada, Samuel L. Jackson como o primeiro narrador do longa, e finalizando com quase toda a narração subsequente Lorenza Izzo com sua Elena, doce e bem interessante, que no final nos é dada como uma boa surpresa conectando tudo.

No conceito cênico a trama trabalhou locações casuais, com uma pegada bem leve e cheia de floreios, nos quais os personagens parecem sempre estar saltitantes, como em comerciais de margarina, mas claro com leves devaneios mais tensos e fortes, dando abertura para algumas incisões mais duras, e assim sendo o longa nos entrega uma Nova Iorque bem formatada, sem muitas cores, e também sem muita palidez, e uma Espanha interiorana, no meio das oliveiras de Andaluzia, com um tom bem rural, mas interessante de ser visto também, e sem muitos floreios de elementos cênicos, o longa entrega boas partes e dinâmicas. A fotografia não quis entregar em conflito com a arte, e muito menos com a proposta do longa, usando apenas artifícios de tonalidade para realçar os momentos de vilão e de herói de cada personagem, não pesando a mão em nada, e nem forçando a barra para que o público julgasse cada um, e assim sendo o resultado agrada.

Enfim, é um filme bacana, bem trabalhado, com um ar musical envolvente mais por estar sempre falando de Bob Dylan do que tocando muitas canções realmente, e que consegue fluir agradando no que passa, mas que certamente saímos da sessão apenas achando que vimos algo bonito e simples, sem muita coisa para pensarmos nele, e nem ficarmos lembrando para recomendar, mas ainda assim o resultado passa bem longe de algo ruim, valendo para quem gosta de romances novelescos bem amarrados, que aí sim vão sair apaixonados com o que verão na telona, mas do contrário, quem for esperando conferir um longa romanceado com uma pegada dramática mais envolvente mesmo sairá levemente decepcionado. Ou seja, recomendo ele com algumas ressalvas, e assim sendo fica a dica para quem for conferir na estreia da próxima semana. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje, mas volto amanhã com mais um texto.

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