Ponte dos Espiões (Bridge of Spies)

10/23/2015 02:37:00 AM |

Que Spielberg é aficionado por guerras, isso praticamente todo mundo sabe, e também sabemos que ultimamente ao dirigir filmes tem optado preferencialmente por temas mais politizados, aonde os diálogos predominem frente às explosões, que são mais comuns nos longas que produz de outros diretores, pois desse modo consegue trabalhar mais com seus atores prediletos de uma maneira mais centrada e clássica, como gosta de aparecer em frente dos holofotes. E com "Ponte dos Espiões", ele conseguiu o feito de uma maneira bem mais harmoniosa que seus dois últimos filmes "Lincoln" e "Cavalo de Guerra", pois ao não ficar tão preso à patriotagem americana, o resultado do filme se volta à boa atuação de Tom Hanks, que entregou todas suas expressões à exaustão de um advogado de seguros que virou negociador governamental, e pasmem, o longa é baseado em fatos reais, ou seja, as negociações, os personagens e muita coisa presente no longa existiu realmente. Porém, assim como todo longa clássico do diretor, faltou um pouco mais de dinâmica, e quem não for realmente fã de dramas de espionagem sem quase nenhuma ação, certamente irá dormir nas salas do cinema.

O longa nos mostra que em plena Guerra Fria, o advogado especializado em seguros James Donovan aceita uma tarefa muito diferente do seu trabalho habitual: defender Rudolf Abel, um espião soviético capturado pelos americanos. Mesmo sem ter experiência nesta área legal, Donovan torna-se uma peça central das negociações entre os Estados Unidos e a União Soviética ao ser enviado a Berlim para negociar a troca de Abel por um prisioneiro americano, capturado pelos inimigos.

O roteiro de Matt Charman junto dos Irmãos Joel e Ethan Coen foi bem trabalhado para desenvolver a história principal do advogado ao ser convocado para defender alguém que ninguém desejava, afinal era um "inimigo" do país em plena Guerra e ao mesmo tempo contar rapidamente toda a situação dos demais personagens mais jovens que foram moedas de troca na guerra mais negociada do que batalhada dos anos 60. Porém é notável que cortaram tantas cenas dos dois jovens que acabou parecendo que eles simplesmente foram capturados e no estilo de vamos salvar eles, o personagem de Hanks se comove e quer de qualquer maneira isso, não colocando nada muito mais intenso para que comovêssemos por eles, de modo que ficamos mais conectados com o velhinho soviético do que com os reais "mocinhos" da história. Claro que isso é algo que Spielberg como diretor tem de defeito também, pois ao escolher determinado ator para o personagem, ele ataca com unhas e dentes a câmera para o ator, e adeus todo restante, então acredito que se um dia fizerem uma versão com menos cortes, talvez isso possa estar mais presente. Mas dessa maneira, felizmente não forçaram tanto a barra com patriotismo e a vertente de todos os ângulos acaba sendo criado na conexão advogado contratado pelo estado e cliente que já está lascado mesmo e qualquer ajuda é válida, e nesse contexto, o diretor soube tirar ótimos momentos de conversas entre os protagonistas e principalmente trabalhar pequenos ambientes para causar todos os sentimentos necessários para que o público também entrasse no clima da cena, e assim sendo, o resultado de muitas cenas foram incríveis tanto nos EUA, quanto em Berlim quando entram outros personagens fortes. E assim, posso dizer que talvez lembrem do diretor nas premiações, afinal cara de filme premiado tem.

No conceito das atuações, temos muitos bons atores fazendo papéis picados e envolventes, e falar um pouco de cada um seria até criminoso, pois o que vale mesmo deles é o personagem em si, e não o ator, mas claro que os principais tiveram o destaque merecido, e dessa maneira vamos falar um pouco deles. Tom Hanks sempre vai ser aquele ator clássico que já vamos ao cinema sabendo bem o que esperar dele, ou seja, uma atuação com muita expressão, dinâmica nas cenas que forem preciso, e claro, um texto feito para que em sua boca seja o mais convincente possível, e aqui tudo foi na medida para que seu James Donovan ficasse com a sua cara, de modo que não queremos nem saber quem foi o cara, mas vemos Hanks fazendo algum personagem marcante que temos de acompanhar bem e pronto. Em compensação, Mark Rylance deu uma personalidade para seu Abel que diversas cenas acabaram tão incríveis que logo de cara ficamos pensando quem seria esse ator, pois tudo ficou minucioso, claro e envolvente para que o público o defenda também e torça por bons momentos seus, e isso são raros atores que conseguem trabalhar, então já certamente iremos caçar mais filmes dele e ver se o cara é bom mesmo, ou aqui Spielberg o fez crescer. Amy Ryan caiu bem para o personagem da esposa de Donovan e embora faça muitas caras de assustada, suas cenas finais foram incríveis no contexto expressivo, e comovem bastante para todos que acompanharam a história a fundo. Os demais como disse acima, tiveram uma participação bem menor, mas sempre que estavam em cena Alan Alda como Juiz Thomas e Sebastian Koch como Vogel, o desenvolvimento da trama ficava bem interessante e cheio de discussões bem encaixadas. Como falei também, infelizmente Will Rogers como Pryor e Austin Stowell como Powers ficaram bem em segundo plano, então suas atuações até foram condizentes com os personagens, mas não puderam mostrar nada além de três cenas cada um, o que é um crime monstruoso principalmente para com Stowell, afinal a história biográfica que existe é em cima do que aconteceu com Powers, sendo o restante encaixado na trama e não o inverso, ou seja, adaptaram bem tudo para que o personagem quase sumisse.

No conceito cênico do filme, claro que Spielberg não deixaria por menos e o resultado que cobrou de sua equipe artística foi gigantesco, e a Berlim devastada tanto pelo frio quanto pela Guerra e a divisão do muro foi tão precisa que chega a impressionar, mesmo que com poucas cenas externas, afinal o custo aumentaria demais para representar tudo visualmente, mas quando foram trabalhados os planos que necessitavam mostrar ambiência, o resultado foi muito bonito de acompanhar. Talvez um defeito da equipe de arte tenha sido em relação ao visual de ternos de época, pois ficaram atuais demais em diversas cenas, o que não podemos dizer que naquela época os ternos não eram tão bem feitos, mas em alguns momentos isso ficou chamativo demais, e talvez pudessem ter dado uns tons mais antigos que agradaria mais. Já disse isso várias vezes aqui no site e volto a repetir, a fotografia em cenas de neve é algo que não existe nada mais lindo de ver, e quando acertam a mão para que o contexto todo se encaixe ao redor da iluminação que o branco incorpora, o resultado acaba ficando incrível de ver, e aqui cada cena foi pensada para trabalhar com muita vida tudo na tela, mas mesmo contando com esse artifício, a cena mais trabalhada de sentidos da fotografia certamente é a da cadeia aonde a luz estourando pela janela, com a sombra do personagem de Hanks se destacando como se tivesse a grande ideia foi uma sacada muito bem usada.

Enfim, que é um ótimo filme, isso sem dúvida alguma posso dizer, mas que poderia ser muito melhor se tivessem colocado mais dinâmica nos personagens "menores" e nos contasse um pouco de sua história também para tudo ficar mais vivo. É um drama bem trabalhado nos diálogos que quem gosta do estilo vai sair bem contente com tudo que é apresentado, mas quem gosta de longas com mais ação, certamente irá dar umas cochiladas se for ver o filme muito tarde. Dessa maneira, é um longa que recomendo somente para quem gosta mesmo desse estilo mais denso de Spielberg, pois senão a chance de reclamar de tudo o que é mostrado é alta. Bem pessoal, fico por aqui agora, mas nessa semana até que apareceu uma boa quantidade de estreias, então volto em breve com mais textos, deixo meus abraços e até breve por enquanto.


4 comentários:

Unknown disse...

Boa tarde,
Assisti esse filme ontem, e já estou aqui de novo para ler a sua crítica, ter outra opinião abre os horizontes. hehehhehe.
Curti os diálogos do Hanks e Rylance, foram bem engraçados, "Isso ajudaria" heehhehehe.
Uma coisa que você disse e que faz todo o sentido, único efeito negativo de contratar um super ator é que seu personagem, apaga todos os outros.
Deveriam ter investido mais nos prisioneiros, pelo menos no estudante. Ele foi ajudar o professor, acabou sendo preso, ai o advogado fica sabendo e quer liberta-lo a qualquer custo. Tipo What's. E depois, esse personagem é citado até o final da projeção.
Será que pode ter cortado as cenas do garoto, para diminuir o tempo de duração do filme?

Fernando Coelho disse...

Olá WeWe, com certeza esse longa sofreu muitos cortes na edição... aliás, espero que soltem uma versão do diretor junto com o bluray, pois deve ter outra visão, que vai certamente mostrar mais detalhes que acabaram ficando estranhos... Essas diminuições de tempo são cara clássica de produtores que apenas colocam pro editor uma meta numérica e o cara se não for bom mágico lasca com tudo! Disse tudo sobre o whats!! Rssss... Abraços!!

Tips en finanzas disse...

Eu realmente gosto desse filme! Ponte dos Espiões marca o retorno de Steven Spielberg à boa forma e ao modo mais gostoso de se fazer cinema: com criatividade e amor pela arte. Como sempre, Hanks traz sutilezas em sua atuação. O personagem nos cativa, provoca empatia imediata graças a naturalidade do talento do ator para trazer Donovan à vida. Mark Rylance (do óptimo Filme Dunkirk Completo ) faz um Rudolf Abel que não se permite em momento algum sair da personagem ambígua que lhe é proposta, ocasionando uma performance magistral, à prova de qualquer aforismo sentimental que pudesse atrapalhá- lo em seu trabalho, sem deixar de lado um comportamento espirituoso e muito carismático. O trabalho de cores, em que predominam o cinza e o grafite, salienta a dubiedade do caráter geral do mundo. Ponte dos Espiões levanta uma questão muito importante: a necessidade de se fazer a coisa certa, mesmo sabendo que isso vai contra interesses políticos ou de algum grupo dominante. A história aqui contada é baseada em fatos reais, mas remete também ao caso recente do ex-administrador de sistemas da CIA que denunciou o esquema de espionagem do governo americano em 2013 e foi tratado como um traidor, mesmo que tenha tido a atitude correta. É uma crítica clara à hipocrisia norte-americana, que trabalha sempre com dois pesos e duas medidas em se tratando de assuntos como esse.

Fernando Coelho disse...

Olá Tabaré, realmente esse lance de dois pesos duas medidas sempre existiu e sempre existirá nos governos, e principalmente no mundo, e o longa foi bem incidente nisso... mas sempre esperamos ter alguma boa alma para mudar não é mesmo... abraços e obrigado pelo comentário!

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