Deixe-me Viver de Luiz Sérgio

10/16/2016 10:50:00 PM |

Há muito tempo tenho falado que se alguém deseja ganhar dinheiro com cinema no Brasil sem ser fazendo comédias bobas, o jeito é ir para os livros religiosos, pois qualquer religião hoje no país possui diversos adeptos e com toda certeza irão lotar as salas dos cinemas. E não digo isso sem nenhum embasamento, pois sem falar dos grandes sucessos cristãos americanos, e usando como base apenas os longas nacionais, pelo lado evangélico todos os filmes do R.R.Soares lotaram, pelo lado católico tivemos alguns filmes envolvendo Padre Marcelo que deram um bom fluxo, e claro que os que mais possuem livros nacionais para se adaptar, os espíritas andam conseguindo encher bem as salas dos cinemas, tanto que hoje ao pedir meu ingresso para o filme, e ao ver que ao meu lado nos outros dois guichês também haviam pessoas comprando para o mesmo filme, a moça da bilheteria exclamou: "nossa esse filme está bombando!", e não é para menos, pois a história de "Deixe-me Viver de Luiz Sérgio" é interessante, bonita e possui uma proposta ousada para ser trabalhada apenas em um filme. Porém estamos falando de cinema em um país que só tem grandes financiamentos em poucas obras, e para um longa que trabalha muito o lado abstrato de um lugar que permeia demais as imaginações, fazer uma computação gráfica simples acabou pesando demais para o diretor (que economizou bem na equipe fazendo praticamente tudo sozinho) que acabou errando demais no contexto visual e chega até incomodar o excesso de cenas filmadas em chromakey, aonde os atores acabaram se perdendo demais em como fazer suas cenas, e sendo assim, é capaz que quem tenha lido o livro até se empolgue mais com a trama, pois já irão conhecer tudo, enquanto quem nunca sequer pensou na situação pode até dar umas leves cochiladas.

O longa nos conta que Luiz Sérgio é um jovem que desencarnou aos 23 anos. No plano espiritual, ele é convocado a escrever vários livros, dentre eles "Deixe-me Viver". Para escrever o livro, ele se une à uma equipe de espíritos que trabalham no resgate de outros espíritos que se encontram em ambientes espirituais inóspitos - umbrais para os espiritas, purgatório para os católicos. Principalmente espíritos que foram rejeitados pelos pais, e os próprios pais depois de deixarem o plano físico. Luiz se defronta com vários casos, e passa a interagir energeticamente com as famílias, no sentido de criar harmonia e laços mais fortes entre os pais e filhos. A equipe de espíritos, a qual Luiz está integrada, é composta por Dr. Zeus, Dra. Kelly e Aloísio. Médicos espirituais que desenvolvem terapias para o restabelecimento psíquico daqueles que sofrem. Motivados por um amor incondicional, eles procuram resgatar todos aqueles que necessitam e querem ajuda para sair das inferiores condições que se encontram.

Podemos dizer com certeza que o diretor e roteirista Clóvis Vieira trabalhou bem na adaptação do livro, pois conseguiu transmitir com clareza a ideia da trama e toda a vivência do personagem principal, mas não sei de quanto foi o orçamento do longa, porém certamente para ter uma criação num nível decente de computação gráfica teriam de ter muitos milhões a mais, pois chegou a beirar o amadorismo a quantidade de cenas aonde os personagens parecem nem saber o que estão olhando e dessa forma a dinâmica entre eles acabam soando falsas e sem muito nexo. Não digo que isso tenha atrapalhado a essência do filme, mas com toda certeza deixou que o filme desandasse para um rumo quase que sem volta. Por exemplo todas as cenas que ficaram do lado externo sem ser as cenas num jardim aparentam uma simbologia tão falsa que em alguns momentos mesmo que os personagens não estejam voando, eles parecem desconectados do solo, ou seja, erros do tipo inaceitáveis para uma produção que vá para os cinemas.

Como disse acima, as atuações falharam muito pelo simples motivo dos atores não saberem ao certo para onde olhar, e para isso funcionar num longa aonde praticamente 70% do filme foi filmado em chromakey, necessitaria de um diretor de nível altíssimo que já tivesse trabalhado muito com esses aparatos, o que não é o caso de Clóvis. Outro grande erro, talvez por parte da adaptação do livro para os momentos atuais, mas que o protagonista poderia ter economizado, é a quantidade de gírias que Bernardo Dugin diz com seu Luiz Sérgio durante toda a trama, claro que desejavam deixar o filme num tom mais jovial para cativar novos participantes ao espiritismo, mas soou estranho demais a maioria das cenas, e o jovem ator não conseguiu ser responsável o suficiente para manter a expressão correta dentro do que o filme necessitava, além claro dele mesmo ter sofrido demais com o visual estranho das cenas que provavelmente ele não viu durante a gravação. Sabrina Petraglia foi a que mais saiu-se bem nas suas cenas, pois sua Dra. Kelly trabalhou com uma seriedade condizente e usando de bons trejeitos calmos a atriz soube dosar seus momentos com classe e agradar por trabalhar nas cenas "voadoras" do chromakey sem muita exclamação, o que foi mais correto de ver. Renata Sayuri também fez boas cenas trabalhando mais em sintonia com sua Irmã Rosália, e foi feliz por ficar mais dentro de um espaço sem muitos efeitos, porém com isso também teve poucas cenas. Fernando Peron teve cenas estranhas com seu Aloísio, mas nem por isso se atrapalhou em trejeitos falsos, falhando mais nas cenas que tiveram efeito do que nos momentos que precisou dialogar, e sendo assim como ator saiu-se bem. Outro que poderia ter mais cenas foi Rocco Pitanga, pois seu Mestre Otávio é interessante de ver, soou com personalidade e principalmente por ficar num cenário bem mais condizente soube interagir bem com o protagonista e dar um tom agradável para suas cenas, sendo com certeza o destaque do filme. Os demais até tentaram ter boas cenas, mas nada que vá valer gastar muitas linhas dizendo algo.

Sobre o conceito visual já reclamei demais das cenas feitas digitalmente, então vou optar em nem falar mais delas, pois seria mais desastre em cima de desastre, portanto vou falar do que funcionou, e que certamente se desse para o filme ficar somente nelas teríamos algo primoroso, que foram as cenas nos jardins, pois o misto de água corrente com uma paisagem maravilhosa deu um tom tão bonito para as cenas que ocorreram ali que acabaram agradando demais e lembraram até um pouco da novela espírita "A Viagem" que funcionava praticamente só num jardim desse estilo. Embora o umbral tenha sido filmado sem muito recurso, as cenas de chão foram interessantes de ver, porém colocaram tantos efeitos de fumaça nas cenas que tudo soou artificial e estranho, e isso acabou deixando o lado mais sombrio da trama virar quase algo cômico, o que definitivamente não era o objetivo. Quando se trabalha muito com chromakey é necessário também muita iluminação para que o tom não saia estranho, e felizmente nesse contexto a equipe não falhou, pois poderia aparecer diversas falhas de recorte e isso não ocorreu, porém deixou o longa com um tom muito esbranquiçado, o que também não é legal de ver, ou seja, vou deixar uma dica para quem for tentar fazer um novo longa espírita, fuja de cenas em chroma se não souber fazer com perfeição.

Enfim, um filme que tinha um grande potencial, que trabalhou bem as canções colocadas, e que principalmente teve uma história maravilhosa contada, mas que errou tanto em técnicas que por bem pouco não virou a piada do ano. Sei que tenho de apoiar o cinema nacional, afinal como sou produtor também torço muito para que nosso cinema vire uma indústria e tenha bons investimentos, mas se posso dar uma recomendação sobre o filme é que leiam o livro ao invés de ir ao cinema conferir o longa, pois com toda certeza o resultado vai ser bem melhor. Bem é isso pessoal, fico por aqui hoje com a última das estreias dessa semana, então abraços e até breve com mais textos.

PS: A nota se deve inteiramente à boa história e claro como ela foi adaptada para o cinema, mas se fosse depender de técnicas não chegaria nem a 2 coelhos.

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