Cinco Graças (Mustang)

2/20/2016 02:04:00 AM |

Existem alguns filmes que levantam tantas polêmicas que aqueles que gostam de polemizar em seus textos acabam viajando tanto que o foco no filme como cinema mesmo acaba desaparecendo, e com "Cinco Graças" poderíamos discutir imensamente toda a questão de mulheres sendo tratadas como objetos em diversos países, questões de culturas, e diversos outros temas possíveis que muitos julgam não existir mais, mas estão coexistindo em muitos lugares por aí nesse momento. Mas como essa não é a onda do Coelho de criar polêmicas e discussões acaloradas por aqui, vou focar somente na estrutura do filme, pois aí é que entra a parte que entendo bem e não vou falar besteiras para vocês, mas quem quiser brigar, fique a vontade lá embaixo nos comentários, só não garanto aprofundar tanto. Dito isso, o que posso dizer tecnicamente da trama do longa é que mesmo sendo um dos filmes indicados ao Oscar de Filme Estrangeiro (confesso que fui assistir sem saber disso) e ter trabalhado belamente com cinco jovens bem dinâmicas, a trama é tão arrastada que seus 97 minutos parecem ter bem mais do que 3 horas. Claro que a beleza da história por mostrar a jovem Lale tentando de tudo para não seguir a linha tradicional e histórica das mulheres de seu país é algo bacana de ver, mas o restante do filme trabalha tanto a energia negativa em cima desse cunho que ao mesmo tempo que ficamos pasmos com tudo o que é mostrado, ficamos cansados com a falta de ritmo da trama, e assim sendo é um filme diferente que vai agradar bem poucos e deixar a turma feminista mais revoltada ainda com o que vai ver.

O filme nos mostra que no início do verão em um vilarejo turco, Lale e suas 4 irmãs brincam de forma debochada com os meninos, o que acarreta em um escândalo de consequências muito fortes: a casa delas se torna praticamente uma prisão, elas aprendem a limpar ao invés de ir para a escola e seus casamentos começam a ser arranjados. As cinco não deixam de desejar a liberdade, e tentam resistir aos limites que lhes são impostos.

Confesso que não sou o maior conhecedor de longas turcos, mas gosto muito das tramas entregues pelos franceses, e esse aqui sendo o indicado da França para o Oscar, até consigo enxergar o motivo principal de chegar entre os cinco que irão disputar mesmo o prêmio, e claro que é pela polêmica forte que disse no começo do texto, pois se olharmos o trabalho à fundo do diretor e roteirista Deniz Gamze Ergüven, vamos chegar ao detalhamento de um longa bem simples, com nuances bonitas, interpretações bem colocadas, mas ainda assim sem muita expressão de cinema como arte, procurando trabalhar somente o lado polêmico e simbólico da relação feminina num país com duas frentes dominadas culturalmente por uma religião de muitas interpretações. Claro que temos planos perfeitos, aonde podemos filosofar aos montes sobre tudo o que está sendo mostrado (90% deles aparecem no trailer), mas e o que fazer com o restante? Essa questão sequer passou pela cabeça do diretor, mas como nossos velhinhos da Academia de Artes, e também alguns outros votantes de grandes prêmios gostam de polemizar, a escolha da ideologia do diretor caiu como uma luva, e mesmo sem ter visto os demais candidatos, diria que ficou no topo das votações.

Não diria que é um dos pontos mais fortes do longa, mas a atuação principalmente colocada nas garotas foi de bom tom e acertou em cheio no estilo que a trama desejava. Claro que para isso foram espertos de pegar jovens talentos em testes e que aliado à uma boa direção de elenco, conseguiram trabalhar bem a desenvoltura das jovens. O destaque fica para a menor do grupo, Günes Sensoy que deu a sua Lale um vigor completamente diferente do que era esperado e em diversos momentos só ficamos esperando qual vai ser a nova que vai aprontar para não ter de seguir as regras impostas tanto pela sociedade quanto por sua família (que faz parte da sociedade, claro!), e dessa maneira, a jovem impressiona bastante com expressões marcadas, textos afiadíssimos e uma dinâmica bem fora dos padrões do filme todo. A beleza expressiva de Ilayda Akdogan e Tugba Sunguroglu fazendo Sonay e Selma respectivamente chamam mais atenção do que as expressões que trazem à tona quando vão se casar, claro que a noite de núpcias de Selma é o ponto marcante para um dos diálogos mais interessantes do filme, mas poderiam ter pedido uma cara mais de espanto da jovem do que a cara de paisagem que ela fez. Doga Zeynep Doguslu ficou sempre em segundo plano com sua Nur, e isso é estranho de ver em um filme mais colaborativo, talvez por ser a personagem com menor impacto e não ser nem a caçula, muito menos a mais velha, acabou ficando bem para escanteio até mesmo no texto da trama, claro que no momento impactante de seu casamento ficou bacana seus trejeitos pela janela fazendo tudo o que a menor mandava, mas ainda assim não chamou atenção como as demais. E claro que Elit Iscan entregou uma Ece bem trabalhada, principalmente quando entra em choque para com seu casamento, e claro o estilo que resolve para fechar tudo, mas foi o momento mais clichê da trama, embora choque alguns. Agora dos adultos é difícil citar algum que tenha ficado bem na tela, pois o tio interpretado por Ayberk Pekcan ficou caricato e forçado, embora suas saidinhas noturnas choquem a maioria, ficou algo bem sutil de ser notado, e a\ avó interpretada por Nihal G. Koldas também só consegue envolver nas cenas iniciais aonde seu desespero floresce mais interpretação, pois depois é quase um enfeite cênico. Temos de dar um leve destaque para as cenas mais leves e gostosas do filme que foram protagonizadas por Yasin, bem interpretado por Burak Yigit, pois o jovem ator conseguiu agradar bastante em seus momentos e trabalhando um estilo mais descolado chama a atenção em todas as cenas que aparece.

A direção de arte colocou em suma todo os meios possíveis da avó e do tio acabarem com a liberdade das moças, então o filme se desloca sempre para mostrar uma casa simples que vai tomando ares de prisão, com muitas grades por todos os lados, e no entremeio diversas receitas para que as jovens virem esposas prendadas, e com essas cenas pudemos conhecer mais da cultura do país através principalmente dos elementos cênicos, o que é um fator que embora polêmico, mereça uma boa atenção. Ou seja, de uma maneira simples, mas bem feita nos adereços e figurinos, a trama conseguiu atingir seus objetivos. A fotografia pecou um pouco em ser dura demais, não trabalhando quase com sombras, o filme ficou quase que 100% num único tom pastel, e mesmo com uma cena de abertura belíssima na praia, e depois algumas nas florestas, o tom sempre voltava para o marcante que desejavam para limitar a cena.

Enfim, não diria que é um filme genial, mas também não é um filme que mereça ser jogado de escanteio, talvez ocorra mais discussões sobre a temática do longa do que seu contexto artístico, então isso é uma pena, pois filmes polêmicos até são interessantes para boas discussões desde que tenham um viés artístico também, mas quando servem apenas para causar, acaba se tornando um pouco chato demais (e como acaba sempre ocorrendo nesses filmes, ao sair você já vê um tiozinho dentro da sala mesmo, perguntando o que achou do filme com a cara confusa, o fato é que não é um longa para todos). Ou seja, recomendo o filme para quem goste do estilo de longas mais distópicos, pois quem prefere dramas clássicos, acabará achando tedioso demais. Bem é isso pessoal, fico por aqui agora, mas ainda faltam duas estreias que vieram para o interior, então abraços e até breve.

Semi-spoiler: Muito se fala que feministas estarão em peso para ver o filme, mas posso até estar enganado quanto ao final, mas não acredito que tenha sido uma coisa boa o que ocorreu, aonde elas entram.


1 comentários:

Anônimo disse...

Só pra constar: é diretorA, talvez seja por isso q vc tenha simplificado a abordagem do filme "sem muita expressão de cinema como arte, procurando trabalhar somente o lado polêmico e simbólico da relação feminina".. é uma mulher falando sobre isso. O filme é maravilhoso!!! hehe

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