No Olho da Rua

6/11/2014 01:13:00 AM |

A cada dia descubro mais sobre produções nacionais que acabam nem aparecendo direito no mercado comercial de filmes, seja por escolha dos diretores ou até mesmo pelo mercado não digerir certamente alguns filmes. Alguns filmes até possuem qualidade técnica, conseguem um bom dinheiro para filmas, mas acabam deixando de lado o principal que é o que insisto em dizer que temos o famoso erro de conseguir verba para filmar, mas não colocar para o público ver, e com isso não ganhar dinheiro para fazer um novo filme, precisando novamente pedir para o governo mais dinheiro se quiser fazer um novo filme. Com o longa "No Olho da Rua", essa história se repete, e não pôr o filme ser algo ruim, afinal temos uma visão bem interessante da proposta de mostrar até que ponto chega uma pessoa ao ver sua dignidade ser afundada, mas com toda a verba captada por editais, poderia ter sido trabalhado uma campanha maior para exibição do filme comercialmente para que não apenas 8 salas de cinema tivessem visto ele desde que foi filmado em 2009 e ficasse dependendo apenas de exibições em circuitos do SESC e outros meios que acabam nem sendo contados pela ANCINE como número de visualizações, e com isso em breve quando o diretor for lançar um novo filme precisará novamente correr atrás do governo.

O filme nos mostra que Otoniel Badaró é um metalúrgico que, após trabalhar em uma fábrica por 20 anos, é demitido. A situação fica mais complicada ainda porque Camila, sua esposa, está grávida. Revoltado, Otoniel resolve cortar o próprio braço e assina sua demissão com o próprio sangue. A partir de então ele passa a fazer carretos ao lado de Algodão, um estudante de cinema que vive na favela e mantém um canal pirata de TV. Tudo piora ainda mais quando Otoniel tem seu carro roubado.

O roteiro criado por Di Moretti em cima do argumento do próprio diretor Rogério Corrêa é algo que pode ser refletido e discutido por horas a fio, e felizmente por ser uma sessão comentada do SESC tivemos essa oportunidade do diretor explicar melhor como foi a produção e o público de 3 pessoas discutir com ele o que achou de alguns pontos. Ao colocar diversos contrapontos na história e nos personagens, o diretor trabalhou sabiamente em colocar o protagonista para ir ladeira abaixo com sua dignidade e ir testando todos os seus limites de forma à criar uma abrangência maior de não mostrar apoio nem ao modo sindicalista que alguns operários vivem, muito menos um âmbito religioso para que o personagem principal conseguisse encontrar um aporte para se segurar, mas com a falta de um ritmo mais trabalhado e personagens coadjuvantes fora da força interpretativa do protagonista, o longa fica raso ao desenvolver apenas um elo de várias outras pontas que o filme poderia atingir.

Quanto da atuação dos protagonistas, o que vemos é um esforço de Murilo Rosa para ser visceral em seu personagem e nos convencer de seus atos, e o mais engraçado é que podemos considerar que é o ator mais versátil que conhecemos no cinema nacional, se compararmos suas atuações de filmes contra as de novelas, pois ele adentra tão fortemente os personagens nas telonas que nem parece o mesmo ator galanteador e sem força de expressão das novelas, claro que tudo que fez foi muito bom, pena que o restante não colaborou tanto para que seus atos fossem melhores. Gabriela Flores vou escrever aqui exatamente o que disse para o diretor, que ficou parecendo quase que um objeto cênico, um vaso sem expressão faria mais que ela, não dando suporte algum para que o protagonista agisse de forma melhor e nem expressando qualquer sentimento nos momentos que precisaria agir para chamar atenção para si, e o personagem feminino na história poderia ser o suporte que o filme deslancharia para uma outra vertente. Leandro Firmino da Hora é divertido e consegue fazer um personagem com perfil completamente diferente do que costuma ser dado para ele, e agrada por trabalhar conscientemente, mesmo que seu personagem seja apenas um alivio dentro de toda a tensão que a trama poderia firmar sem ele. Pascoal da Conceição, assim como outros atores icônicos da TV dificilmente conseguem tirar trejeitos característicos sendo nosso eterno Dr. Abobrinha do Castelo Ratimbum, e com um personagem forte e excêntrico onde foi misturado um pastor sindicalista, dois vértices que não costumam se ligar, ele acaba fazendo bem o papel, mas forçado demais para o lado clichê dos pastores. Dos demais atores, a maioria possui apenas pontas e quase não temos o que destacar, somente alguns momentos de Eric Lenate chamam a atenção, mas não por serem bem feitos, mas pela fraca luta de corpo, onde ele como um judoca que é mostrado em determinada cena, não perderia para um sedentário subnutrido.

Visualmente o longa trabalhou bem um retrato de uma São Paulo mais próxima da periferia, o que não costumamos ver tanto nos cinemas, e dessa forma, o acerto das locações foram mais coerentes, pois usou de elementos cênicos bem encaixados para retratar uma casa simples, uma empresa metalúrgica não grandiosa mas que ainda assim é bem sindicalizada, alguns bares/boates de ponta de vila, e sempre fazendo de tomadas mais fechadas para não mostrar furos de cenários, a equipe de arte acabou agradando bastante. A fotografia não trabalhou com tantos filtros e com isso a gramatura escolhida pelo diretor ao filmar com uma Super 16, ao ser exposto pela quantidade de luz usada nas cenas noturnas deixou bem interessante de ser visto.

Agora um dos pontos mais falhos está na parte sonora, que deixou muito a desejar por não usar tantas trilhas, então há diversos momentos que o filme cansa tendo apenas o drama do protagonista, e em outros entra algo totalmente clichê que não consegue envolver o espectador. Caso fosse usado mais acertadamente, o longa teria ritmo e agradaria bem mais.

Enfim, é um filme bacana de ser visto, mas está bem longe de ser uma obra prima e só mostra mais uma vez que nem sempre ter algum ator de renome pode salvar um filme, ou seja, prefira gastar mais com uma divulgação eficiente e uma trama mais envolvente para vender muitos ingressos e assim não ficar somente dependendo de milhares de editais para fazer um novo filme. Recomendo ver o filme mais para conhecer trabalhos diferentes dentro da nossa cadeia produtiva nacional, o longa está passando em diversos SESCs e em alguns canais da TV fechada, então quem quiser não deve ser algo difícil de achar. Bem é isso pessoal, encerro a semana cinematográfica aqui, um pouco triste pela próxima ser bem curta com as programações que recebi hoje dos cinemas, mas é o que temos por morarmos no interior e sofrermos constantemente com boicotes das distribuidoras que optam em passar as cópias apenas nas capitais. Fico por aqui hoje, mas volto em breve com mais opiniões, então abraços e até mais.


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