Cara ou Coroa

10/26/2012 01:36:00 AM |

É bacana quando vemos um bom roteiro puramente nacional nos cinemas, ainda mais quando é bem interpretado e tem uma produção impecável, só ficou faltando ter um ritmo mais bem ditado pela direção e uma mão mais firme para que a câmera não tremesse tanto para que "Cara ou Coroa" fosse um ótimo exemplo da filmografia nacional sem ser comercial. Porém esses dois defeitos ainda assim não o descaracterizam de ser um bom nome que passará pelo cinema nacional e espero que seja lembrado por mostrar não necessariamente um filme onde só se mostra a ditadura sai batendo em todo mundo e não os medos e conjecturas que ocorriam nos bastidores.

O filme nos ambienta em São Paulo, inverno de 1971. O diretor de teatro João Pedro, seu irmão Getúlio  e a namorada Lilian são pessoas que, como tantas outras na mesma época, levam a vida entre problemas comuns, decisões corriqueiras e uma questão fundamental: engajar-se ou não na resistência política, atuando, ainda que modestamente, contra a ditadura militar.

O diretor e roteirista Ugo Giorgetti que tem como marcas em sua filmografia sempre um lado bem politizado, consegue engajar uma história interessante envolvendo teatro e ditadura militar, nos mostrando o lance de onde deve-se atuar e como se deve, de modo à mostrar ou não caras para uma época onde muitos viveram dramas altamente fortes de pesadelos e insônias contra os militares, censuras e tudo mais que existiu. Porém o interessante do longa é ver justamente essa faceta de atuação onde todos podem estar sabendo ou não de coisas, e isso o diretor mascara bem, e poderia até ter feito melhor se não tivesse optado tanto pela câmera na mão, o que fez com que o filme ficasse muito cheio de tremores desnecessários em cena, pois tirando isso a ideologia colocada na prática pelo filme se mostra muito fácil de ser conduzida e interpretada.

No quesito atuações temos lados bem extremos, com pontos muito bons para a atuação de Otávio Augusto e Emílio de Mello, e pontos bem ruins principalmente para a figuração e elenco de apoio que se perde em falas desnecessárias, aparições estranhas e caras que beiram o ridículo, mas felizmente não atrapalham tanto a história. Otávio Augusto mesmo que não sendo um ponto chave tão forte do longa, faz suas cenas com uma naturalidade e expressão que vemos exatamente o taxista paulistano preconceituoso da época que tem sua completa ideologia presa ao que vê na TV sendo contra todo o resto que exista ou aconteça. Emílio de Mello faz um diretor de teatro que atua de forma brilhante, tendo diálogos encarnados e muito bem conduzidos, e também se caracteriza muito bem com relação ao personagem que lhe é imposto. Geraldo Rodrigues tem altos e baixos no longa de forma a ter momentos que nos perguntamos porque o filme às vezes cai sobre suas mãos e ele não faz nada para pegar isso. Julia Ianina tem o mesmo problema que Geraldo, mas suas cenas finais mostram que consegue passar emoção quando quer e o personagem pede, se tivesse feito todas as cenas como fez a cena final faria mais jus ao personagem forte que lhe foi entregue. Walmor Chagas é um personagem de falas repetitivas e em muitos momentos completamente desnecessárias, mas como seu papel é importante sua atuação é bem feita, com o desfecho dado pelo narrador se tivesse sido melhor aproveitado no decorrer do longa seria excelente.

O melhor do filme sem dúvida é a direção de arte que recriou uma época perfeitamente, com objetos de cena, imagens e sons de arquivo passando nas TVs e rádios, cenários da época, figurino bem encaixado, tudo está minuciosamente bem estudado, trabalhado e apresentado para qualquer pessoa que queira ver os anos 70 no Brasil, literalmente uma obra impecável. A fotografia obscura de Walter Carvalho também é um ponto bem bacana de ser visto e apreciado, com nuances, sombras e luzes sempre pontuando bem, uma pena apenas ter focado tanto na câmera na mão.

Outro ponto que acabou na minha opinião estragando um pouco o filme é a trilha sonora meio banalizada com músicas algumas vezes bem parecidas com toques mid de celulares antigos, e isso fez com que o filme não tivesse um ritmo apropriado para ele nem enfocasse em nada, ficando alguns momentos que deveriam ser densos até cômicos demais pelo fundo musical colocado.

Enfim, é um filme bem interessante que vale a pena ser conferido. Como disse no primeiro parágrafo não é um filme comercial, então não saíram muitas cópias por aí no país, porém chegou até que rápido aqui no interior, já que estreou no Brasil em 7 de setembro, e agora veio através do Cinecult para Ribeirão. Peço que quem se interessar peça para o pessoal do Cinecult de sua cidade para levar ou fale diretamente para a distribuidora Vinny Filmes mandar o filme para aí. Bem é isso, fico por aqui fechando a semana cinematográfica anterior, mas já preparando para essa nova que começa hoje com 3 filmes por aqui, então abraços e até a noite pessoal.


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